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domingo, 17 de maio de 2020

White Lines e a promessa de um Verão idílico

É bastante fácil para um filme cativar uma miúda que viajou pouco, fez poucas (ou nenhumas) férias paradisíacas, nunca foi para a colónia de férias, não tem casa de campo de família, nem passou um mês inteiro na terra da avó de alguém, longe da supervisão dos pais, das vergonhas e da pressão de tudo o que lhe é familiar: basta juntar um destino de praia longe q.b., corpos bronzeados e boa fotografia.

White Lines, da Netlix (2020)

Comecei a ver White Lines porque cumpre uma premissa básica para mim, no que toca ao entretenimento audiovisual: tem o Nuno Lopes no elenco. Se é um pai em busca pela filha desaparecida, um boémio rico, um engenheiro ou um colector de dívidas do tempo da Troika, eu não me importo. Entra o Nuno Lopes? Eu vejo. Com a mais recente produção da Netflix foi igual.

Entrar no universo de White Lines é aterrar numa Ibiza lotada e quente, sensual e cocaínada. Estou presa a esta série e não porque o argumento me entusiasme por aí além. Estou-me nas tintas para quem matou o Alex Collins, para as disputas das famílias magnatas da ilha ou para qualquer outra história de apoio ao argumento central. Ibiza nem faz o meu estilo, porque gosto de praias desertas cuja banda sonora são as ondas a rebentar e não a mistura EDM do DJ Residente.

A série cativou-me pelo mesmo motivo que me cativou a aventura da Liv Tyler, em Stealing Beauty, as cenas da Grécia no Quatro Amigas e um Par de Calças, o Call Me By Your Name, a boémia vazia de Une Fille Facile, um conto da Elena Ferrante ou o Mamma Mia. Porque junta um destino longínquo, mas estranhamente familiar, e uma aventura emocionante, durante aquela que continua a ser a minha estação do ano preferida: o Verão.

Liv Tyler em Stealing Beauty (1996)

Após incontáveis dias de crise do coronavírus, de sucessivos Estados de Emergência, de medidas de confinamento e dias a fio passados em casa, o que finalmente me está a fazer quebrar é a possibilidade de eu não poder ir à praia e simular, naqueles 20 minutos de caminho entre a minha casa e a Costa de Caparica, que estou a entrar no meu filme de vibe independente-mas-que-na-verdade-é-um-blockbuster que eu tanto queria que fosse um Verão da minha vida.

Une Fille Facile (2019)

Quero uma viagem para longe da minha casa. Quero calor e leituras à beira da piscina. Quero nadar nua no mar, usar vestidos frescos e fluídos, mas favorecedores. Quero ver as estrelas a partir do alpendre, e escrever no meu diário, à janela. Quero um romance de Verão que me faça passar muito tempo na cama. Quero fruta fresca e saladas. Quero a preguiça quente, o tempo a andar devagar e a sensação de que tudo está bem assim, que tudo está certo e que estou apenas a viver.

Já estou velha de mais para ter uma aventura balnear adolescente, embora ainda seja nova de mais para fugir da rotina de adulta e ter uma viagem de auto-conhecimento onde descubro que me quero divorciar, despedir-me do emprego médio e viver a tempo inteiro de chinelos de enfiar o dedo. Então, nos intermédios da vida e com uma perspectiva de um Verão incerto, resta-me viajar pelos olhos da Zoe e sonhar em voltar a sentir o calor do sol no meu corpo e o sal no meu cabelo.


P.S.: White Lines fez-me, ainda assim, perceber que eu até tenho saudades de dançar ao som de música alta (porque é algo que eu fiz poucas vezes) e, caraças, de ter um bom bronzeado. Não me lembro da última vez em que tive um bronzeado que se diga "sim, senhor, viveu um bom Verão!".

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