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sábado, 9 de dezembro de 2023

O PTM devia convidar mais mulheres - quais?

Pedro Teixeira da Mota e Bárbara Bandeira no 22º episódio de watch.tm

Foi ao 22º segundo episódio de watch.tm que Pedro Teixeira da Mota convidou a Bárbara Bandeira, a terceira convidada mulher do programa. A Bárbara, de forma provocadora, que muito me aconchegou o coração, confesso, atira esse facto à cara do amigo PTM: “tu não trazes muitas mulheres aqui, não é”.

E é verdade, mais ou menos, já que em quase trinta episódios (escrevo este texto a um sábado, e não sei quem será o convidado de amanhã), Teixeira da Mota apenas teve três mulheres à conversa consigo: a Maro (que foi sua colega de escola, no liceu), a Joana Marques (colega de profissão) e a Bárbara Bandeira (popstar incontornável da actualidade, porém, neste contexto em específico, namorada de Richie Campbell, amigo do PTM).

Já tinha reparado e também me chateia. No entanto, dei por mim a pensar: o PTM não convida mulheres porquê? E cheguei à conclusão de que poderá ser um problema de bolha: o humor é um meio masculino; “homens não são fãs de mulheres”; machismo estrutural, etc. e troca o passo. Ok, pode ser uma hipótese. Achei uma hipótese básica. Decidi pensar um pouco mais além e perguntei-me: ok, então e que mulheres é que há para o Pedrito convidar?

Foi com alguma tristeza e preocupação que dei por mim a ter dificuldade em saber que mulheres é que eu teria curiosidade em ver ali. Não quero ser mal interpretada: há muitas mulheres interessantes, engraçadas e carismáticas em Portugal, e todas têm boas plataformas e mediatismo associado. Mas não as encaixo no universo watch.tm. Estou a falar de, por exemplo, uma Ana Garcia Martins, a Filipa Gomes, a Beatriz Gosta - curiosamente, três convidadas do Fuso, da Bumba na Fofinha. Estão a perceber o que quero dizer?

Na minha faixa etária, que entendo como sendo também o público do PTM, que mulheres há? Gostava de lançar esta reflexão. Mais do que um problema do Teixeira da Mota em particular, um problema social em geral: porque é que os homens têm a hipótese de saltar para o mediatismo como músicos, desportistas, comediantes, e as mulheres da minha geração ficaram na carreira de influencer? Apresentadora de televisão, youtuber de lifestyle, instagramer.

E agora não me venham acusar de machismo internalizado, por amor de Deus. Quero PENSAR nesta questão: parece que só temos direito a espaço - espaço a sério, não de nicho - se nos posicionarmos como um produto para ser visto e consumido. Uma mulher só tem fãs se for para mostrar cabelos, maquilhagem, os recebidos? Onde está a glorificação para outras ocupações, a glorificação que os homens também recebem?

Envolvida nesta questão, decidi perguntar no Twitter por nomes de mulheres que considerassem “fixes”, talentosas, carismáticas, etc. Surgiram alguns nomes, a Luana do Bem apareceu duas vezes e outros que também já tinha pensado, outros que não escolheria. Aqui vai a lista com os nomes, incluindo os que não escolheria (não vou dizer quais, para deixar no ar o mistério), e outros em que fui pensando. Nunca se sabe se o Pedrito pode chegar aqui ao texto e achar interessante alguma das sugestões.

  • Kika Nazareth
  • Luana do Bem
  • Filomena Cautela
  • Tânia Graça
  • Leonor Caldeira
  • Joana Ribeiro
  • Jéssica Silva
  • Cláudia Pascoal

Quem mais? Onde andam as mulheres? Onde estamos?

sábado, 25 de novembro de 2023

Fechada para Balanço

TL:DR

Será cedo para declarar o ano como fechado? Novembro trouxe-me uma crise política do meu coração e já não estou para mais nada. Não quero pensar “no futuro”, nas decisões pela minha vida que tenho por tomar, estou sem cabeça para pensar em trabalho. Chuto para canto as contas de cabeça que faço antes de dormir, sobre que idade é que terei no ano X, e como vou estar nessa altura. Não quero começar coisas novas, partir à descoberta, desbravar mato. É Novembro. 2023 está por um fio, não vai ser agora que resolvo nada.

Quero ir à costura ter a última aula do ano e fazer umas calças. Planear noites de cinema para rever coisas com mais atenção e ver outras que há tanto tempo esperam por mim. Divertir-me com os colegas no jantar da empresa. Quero pensar nas prendas de Natal das minhas pessoas, ir ver as luzes e decorar a árvore. Rever o Diário da Bridget Jones, talvez chorar. Perguntar aos meus sobrinhos se querem chegar mais cedo, na consoada, para me ajudarem a fazer os brigadeiros.

Comecei 2023 esperançosa, embora já desiludida. Tentando-me enganar a mim própria que não ia ter o final que já sentia me estar destinado. Foi um ano em que me senti flutuante, sempre à espera de começar o que eu queria que começasse [e não começou], e, por isso, sinto que não o vivi. Flutuei por ele, passei-lhe pelos dias, semanas, meses, sempre à espera. E, nos entretantos, a sentir as perdas.


O último café que bebi na minha esplanada. Pacote de açúcar com mensagem enigmática.

Este ano perdi a minha esplanada, com o concessionário a mudar de vida e a deixar fechado o meu café de eleição. O sítio onde ia para escrever, pensar, passar os fins-de-semana na minha companhia. Acabou. O Pedro Teixeira da Mota lançou o último episódio do ask.tm, que tanta companhia me fazia. Acabou. Morreu o gato da infância da minha melhor amiga, uma das nossas gatas do quintal, e o cão vadio mascote da minha cidade. O meu oculista fechou a loja. Um abalo na minha família afectiva trocou-nos as voltas e acabou com as rotinas e dinâmicas que vínhamos a construir. Estes e tantos outros fins de que agora não me recordo passaram por mim, custaram, aceitei-os e segui em frente. Seria um pronúncio? Um omen que eu cegamente ignorava?

Pois então que acabou, também, a esperança - a pessoa de quem gostava não gostou de volta, está a seguir a vida. E o mundo desaba, o vazio chega, as perguntas brotam mas há uma que se destaca: no meio disto tudo, onde andei eu?

Onde andamos nós quando ficamos de forma cega à espera de quem não vem? O que nos passa ao lado? Quem sou eu e porque sou assim? Porque demorei tanto? Posso chamar isto de situationship se acabo a sentir, no final, que tudo só se passou na minha imaginação?

Vejo-me chegada aqui e confrontada apenas comigo própria porque a situação é a mesma de todas as que já passei, mais parecida numas coisas, totalmente diferente noutras. Páro para pensar na forma como lido com estes assuntos do coração, visto ser eu o denominador comum. Tenho algumas respostas e ainda mais perguntas, que não têm cabimento aqui.

Esta questão da Carrie assombra-me desde a adolescência.

Apesar do choque e daquele primeiro rebuliço de sentimentos, este final trouxe-me um certo alívio. Não fiquei destroçada, agarrada aos what if nem angustiada como noutros finais do passado. Percebi e aceitei.

Estou entusiasmada porque vai ser a primeira vez que ajo no mundo sem trazer comigo a sombra de um amor-imaginário e curiosa para perceber onde é que isto me leva. Que decisões de vida tomo, quando não estou a a decidir em prol da hipótese de um alguém? Como vivo os dia e de que forma estou no momento presente, quando não divido a minha presença com o sonho acordado do que eu gostaria que fosse real? Descobriremos.

Apesar de chegar a Novembro com a sensação angustiante de que perdi tempo, as coisas também não são bem assim, e preciso de ser mais justa comigo. Em 2023 continuei a ir ao Duolingo e completei o meu desafio do Goodreads. Pude ir ver o Jamie Cullum com a minha sobrinha. Fui à Escócia ter com os meus tios, fazendo um total de quatro viagens de avião sozinha. Finalmente ofereci-me uma ida à Dama de Copas e descobri a maravilha de ter soutiens que realmente me servem. Pintei um quadro com a minha melhor amiga. Comprei os meus brincos dos cravos. Fui de férias com os meus amigos e descobri sítios mágicos em Portugal. Vi filmes bons, descobri o Rohmer. Fiz progressos no Yoga e estou, ao meu ritmo, a perder o medo de fazer a invertida. Comecei, por fim, a aprender a coser à máquina no meu curso de costura.

Posso ter fantasiado a mais para o meu próprio bem e sentir que me deixei levar na espuma dos dias. Mas, no final de contas, tenho-me a mim, aos meus amigos, enfim, alguma família, tudo bases de suporte para me recordar de quem sou e o que valho.

Já passei por umas tantas “situações”, engates que ficam a meio, sentimentos que não são ditos, traições de confiança, confusões e mal-entendidos, e acabo por continuar a estar cá. Talvez por isso goste tanto desta da Amy e me acompanhe há tanto tempo. Seja aos 14, aos 20, aos 23, ou 28, as pessoas vão e as minhas lágrimas secam-se sozinhas. Estou cá.

Para o ano há mais.

domingo, 10 de setembro de 2023

Review Obras Completas de Maria Judite de Carvalho - Volume V

 

 
 
Terá sido em meados de 2019 - já não sei, não tenho a certeza - que a minha amiga Diana me deu a conhecer Maria Judite de Carvalho, coincidindo com a sua obra a ser reeditada em colectânea. Pensei: fixe, uma escritora portuguesa que não conheço e tenho a oportunidade de ter a obra completa e certinha?? Bora.

Foi assim que fui avançando na colecção e cheguei ao quinto volume das Obras Completas da Maria Judite de Carvalho. Este livro dá-nos uma colectânea de crónicas que a autora escreveu para diversos jornais e revistas; uns pequenos contos; poemas e ainda uma peça de teatro.

Apesar de estar à espera de mais contos ao estilo do “Tanta Gente, Mariana”, a verdade é que as crónicas, principalmente, me prenderam muito. Adorei! Muito se fala da solidão e da presença deste sentimento na obra da autora, no entanto, o que eu sinto é que Maria Judite é uma expectadora exímia do quotidiano e das subtilezas que marcam a vida rotineira.

As crónicas focam-se em vários temas que marcam a actualidade da autora, como o avanço tecnológico, a ida à Lua, os costumes da época. Mas o que mais me espantou e prendeu foi o facto de as crónicas serem dos anos 60, 70 e 80 e os problemas ali retratados serem ainda os mesmos: uma Lisboa que trata mal os lisboetas, a crise na habitação, a falta de árvores (!!!!) na cidade.

É com um misto de estupefacção e encantamento que lemos Maria Judite de Carvalho a escrever algo que, hoje em dia, poderia perfeitamente estar num jornal ou revista, e ninguém iria reparar. A única coisa que mudou foi o facto de Lisboa se ter, pelo menos, aberto ao rio. Uma queixa que a nossa querida Maju tanto expressava, desconsolada.

Depois das crónicas, o livro entrega-nos uma série de pequenos contos (uma página, página e meia), que também são muito bonitos de se ler. Algo que reparei nesta leitura, mais do que a questão badalada da solidão, foi o facto de autora mencionar algumas vezes, mesmo que de forma subtil, o suicídio. Mais do que sozinhas, sinto que as personagens de Maria Judite estão é deprimidas, e talvez naquele tempo não houvesse o vocabulário para o descrever desta maneira.

A seguir aos contos chegam-nos uns poemas que, defeito meu, acabo sempre por ler e seguir em frente sem me sentir particularmente agarrada. São quadras simples e despretensiosas na forma e no conteúdo, mas não é a forma que mais me agrada ler da autora.

Este quinto volume termina com a única peça de Teatro de Maria Judite, que gostei muito de ler. Não conheço Teatro o suficiente para dizer se é boa ou má, portanto avalio a qualidade com o facto de me ter divertido. A peça conta uma historieta caricata bem no estilo trágico-cómico igualmente típico da autora. Sinto que este é um ponto que se esquecem de mencionar sempre que se fala de Maria Judite de Carvalho, que se nota perfeitamente nas crónicas e no sexto volume que já estou a ler, que é o seu sentido de humor. Maria Judite é engraçada e escreve com graça, com uma ironia refinada que sabe entregar a piada para quem a souber apanhar.

Enfim, é sempre um deleite ler Maria Judite de Carvalho. Esta é uma coleção que vale a pena ter na biblioteca e que me orgulho de ter feito.





Maria Judite de Carvalho, Golden Girls e um tempo que já lá vai
 
A minha leitura deste quinto volume coincidiu com ter começado a ver Golden Girls, a mítica série dos anos 80 que conta com a Betty White no elenco. Não me quero estender muito nesta deambulação, mas ler crónicas de meados do século passado e ver esta série, passada no pico dos anos 80, deixou-me com uma nostalgia dentro de mim. Dei por mim com uma saudade de um tempo em que havia comércio de rua, que se via televisão em directo e se reclamava com a programação, em que a vida parecia mais acolhedora e simples.

Longe de mim estar com laivos de velha do Restelo, culpo talvez o facto de estarmos na recta final do Verão e a saturação de estímulos e informação em que vivemos. Sendo eu um bebé dos anos 90 e uma criança dos anos 2000, ainda me lembro bem de como era a vida antes disto tudo assim. E pronto, perdoem-me o crime de sentir uma certa nostalgia por tempos que me parecem, à distância, mais simples.

 
Deixo-vos abaixo algumas passagens que sublinhei e mais me marcaram nesta leitura:

“E o mesmo acontece em todos os bairros de Lisboa. (...) Os Bancos de A a Z multiplicados pelos bairros desta minha pátria que é Lisboa. Minha? Às vezes não sei muito bem.” pp. 64

“Porque quem vai pensar em lagos ou em fontes nesta cidade de destruição e construção, de compra e venda, de aluguer a quem mais dá (...)?” pp. 71

“Eis-nos, pois, numa cidade remendada que vai expulsando de si os habitantes antigos e que expulsará mais tarde outros habitantes que serão antigos e outros e outros, até à perfeição.” pp.74

“Um novo edifício para gente morar? Quase nunca, enfim, muito raramente. (...) E então anunciam-se andares de luxo para gente das embaixadas, para aquelas resistentes “famílias de tratamento”. (...) De resto, poucos podem viver em Lisboa, é uma ambição desmedida.” pp. 76

“(...) pensava outra vez se teria, na verdade, vivido aqui ou noutro lugar qualquer, se a sua longa existência cinzenta, passada entre a secretária onde trabalhava, o autocarro onde viajava e a cama onde dormir, podia mesmo chamar-se vida.” pp.117

“Esperam, é tudo, nesses grandes e velhos andares lisboetas, dos tempos das famílias numerosas e das rendas baratas, transformados em pensões-dormitório, verdadeiras aldeias de gente só.” pp. 143

“Ela, a senhora, tinha hábitos de luxo, que, por serem seus, eram muito mais importantes do que as necessidades essenciais das outras, suas empregadas.” pp. 256

Se chegaram até aqui, aproveitem e sigam-me no Goodreads!

domingo, 18 de junho de 2023

o orgulho de gostar de quem eu gosto

 

A bandeira do orgulho bissexual


[Nota prévia: apesar de a bissexualidade se definir como atração pelo mesmo género e outros, para efeitos estilísticos vou referir-me muitas vezes a “homens e mulheres”. A mesma coisa com a sigla LGBTQIA+, que vou abreviar para LGBT.]

Apesar de existir um B na sigla LGBTQIA+, a verdade é que esse B costuma ser silencioso, incompreendido, menosprezado e invisível. Estamos em Junho, em mais um mês de Orgulho, e por isso quis falar um pouco do que é ser o Bê de LGBT de uma perspectiva muito pessoal.

O problema começa logo na auto-aceitação. Apesar de saber que, por alguma razão, toda a minha vida me senti atraída por mulheres, a verdade é que demorei mais de 20 anos até perceber que, se calhar, eu simplesmente não era heterossexual. Isto porque não cresces com referências, exceptuando o Shot at Love da Tila Tequila, ou então só se ouve os bitaites mais preconceituosos sobre pessoas bissexuais: são promíscuas, vão trair, vão trocar o parceiro por alguém de outro género, são homossexuais em segredo, são heterossexuais em segredo, “tudo o que vem à rede é peixe”, etc.

Mas pronto. Encontras a tua paz no assunto e segues a vida. Ao perceber que não és hetero, começas a entrar noutro espaço mental, emocional e até social. De repente sou obrigada a olhar para mim mesma através de uma nova identidade política que acarreta os seus próprios desafios. Ser bissexual é duplamente (ah!) desafiante, porque tens de combater preconceitos e fobias de toda a gente, de dentro e de fora da comunidade LGBT. É uma sexualidade difícil de ser compreendida por quem é monossexual e a projeção dos preconceitos é desgastante. Existe como que uma cobrança para “escolher” um lado porque é difícil aceitar que alguém se possa sentir atraído por mais do que um género.

Enquanto pessoa bissexual, vivo constantemente a duvidar da minha própria identidade. Isto porque, embora possa gostar de homens e mulheres, essa definição não me serve. Neste momento da minha vida, não me imagino a relacionar com mulheres. Calma! Já sei o que poderão estar a pensar, pois eu já pensei no mesmo: será bifobia internalizada? Não.

A verdade é que eu não me imagino a relacionar com mulheres… nem com homens. Porque eu só me queria relacionar com uma pessoa em específico. A pessoa de quem eu gosto. Quando calha ser um homem, é normal que o meu lado sáfico fique adormecido. Da mesma forma, quando gosto de uma mulher, não tenho absolutamente espaço mental nenhum para pensar em relacionar-me com homens.

Eu não sou bissexual porque gosto “de homens e mulheres”, mas sim porque gosto de quem eu gosto. E eu não gosto de qualquer pessoa, muito menos facilmente. Sou esquisita. Daí ser tão chato e aborrecido para mim explicar a quem vem de fora que sou uma pessoa LGBT, detesto a forma lata com que a minha atração é definida.

Cada vez percebo mais porque é que tantas pessoas bissexuais acabam por não se “descobrirem”, não se aceitarem, ou simplesmente deixarem de lado esta etiqueta e preferirem estar no espectro “no labels” ou “not straight”. É exaustiva esta vida de explicações e de cobranças, externas e internas.

Quantas vezes não dei por mim a pensar “se calhar sou lésbica e estava só a ser vítima de uma heterossexualidade compulsiva”. Depois, também penso “se calhar sou hetero e estou só a objectificar e fetichizar mulheres”. E a verdade é que sou apenas bissexual.

Talvez isto seja confuso porque estamos habituados a definir a atração tendo por base o género (e o sexo, vá) uns dos outros. No meu entender, mais do que géneros (e sexos), a atração acaba por ser pelas características que o outro tem e que, muitas vezes, se encontram em várias pessoas, independentemente do seu género. Mas claro, isto para mim é fácil de perceber, é tão natural compreender que possamos sentir-nos atraídos por qualquer pessoa, é exactamente o oposto das pessoas monossexuais, que têm dificuldade em conceber isto mesmo.

Eu sou bissexual, não porque gosto de homens e de mulheres, mas sim porque gosto de quem eu gosto. Seja mulher, homem, pessoa não-binária, ou de outros espectros da identidade de género.



PS: sim, estou a par que existe a “pansexualidade” mas, na minha humilde opinião, esta definição apareceu devido a bifobia, pelo que prefiro definir-me como bissexual. Também estou a par que existe o conceito “demissexual” mas, na minha humilde opinião, é um conceito estúpido e com o qual não me identifico.

domingo, 9 de abril de 2023

a decisão da inação

 

uma quote perdida no meu pinterest que acabou por fazer sentido

Tenho pensado muito na forma como, enquanto estamos a ponderar que decisão tomamos, a decisão é tomada apesar de nós. Vou pôr isto em termos práticos: acontece-me, com frequência, entrar no metro e ficar a olhar para um lugar vazio e pensar “hum… será que me quero sentar ali?”, e enquanto fico a pensar nisso, entra alguém e vai-se lá sentar. Pronto. Ah, não quiseste decidir e assumir a tua posição? Então a vida, o mundo, o universo, deus, buda, o que lhe quiserem chamar, decide por ti.

Não consigo distinguir se estou a sentir-me estagnada e com vontade de mudar ou se estou só com medo de me deixar ir e não saber onde vou parar. Há muito que paira na minha cabeça a vontade de voltar a estudar, mas pergunto-me se quero realmente voltar a estudar ou se estaria a embarcar numa longa e dispendiosa jornada para sentir que tenho o controlo de algo. Para sentir que assim vou conseguir ganhar mais dinheiro, que vou conseguir viver a minha vida. Não sei.

Ontem cheguei a falar disso com os meus pais, de forma muito leviana, e senti apoio. Depois, sentei-me ao computador e vi que o prazo para as candidaturas ao regime de Maiores de 23 acaba agora em Abril. Ou seja, já era uma decisão que eu teria de ponderar muito seriamente, e ter visto que o prazo acabava agora foi a confirmação de que a vida, mais uma vez, decidiu por mim: é óbvio que não tenho capacidade para tomar esse passo de forma impulsiva. Não será no ano lectivo 2023/2024 que volto a estudar. Ponto positivo: agora tenho cerca de 1 ano para marinar a ideia e pensar, ponderar, repensar, ver onde a vida me leva até lá.

No final do dia, tudo se resume a uma questão de prioridades. E, apesar de o cenário não estar famoso, de eu poder parecer irrealista, de ser preciso uma grande sorte, a minha prioridade continua a ser conseguir comprar uma casa para mim. Ir estudar implicava adiar este sonho em 5 anos e alguns milhares de euros… Porque para estudar e trabalhar teria de ingressar no ensino privado, e isso significa que as minhas poupanças, que tanto me custam a construir, teriam de se sacrificar. Tudo para só me conseguir formar aos 34 anos. E estar, ainda aos 34 anos, a viver como estou hoje. Enfim, a espiral de pensamentos foi por aí abaixo.

Não consigo distinguir se estou com vontade de mudar, ou se estou apenas aborrecida à espera que a vida desenrole. Tenho dias em que estou farta do meu trabalho, das quezílias, do horário, e assusta-me que esteja à procura de soluções mágicas que me vão custar tempo e dinheiro. Assusta-me sentir que estou tão perdida como estava em 2019, quando me despedi da penúltima agência onde trabalhei e jurei que nunca mais iria parar a essa área (acabei por voltar ainda esse ano, e depois fui dispensada já em cenário covid). Sei que não estou nessa fase porque todos os dias me levanto, apresento-me ao serviço, ganho o meu ordenado e giro a minha vida. Se estou na fase onde preciso de estar, então porque é que estou sempre à procura de novas saídas e novos estímulos? Porque é que não aceito que, para agora, isto é o que preciso de viver? Eu sei, eu racionalmente sei, que este trabalho há-de ser temporário e mais um na minha vida. Mais vale aproveitar enquanto o tenho, certo?

Aqui segue uma lista de coisas aleatórias que só serão possíveis na minha vida porque vou continuar, por enquanto, como estou: investir em mais certificados de aforro, comprar uns ténis novos, viajar de vez em quando, fazer novos projectos de crochet, ir aprender a costurar à máquina, fazer yoga, ter a consciência tranquila de que estou a trabalhar para, pelo menos, um sonho. O maior sonho.

Quando estou no metro a pensar se me vou sentar no lugar vazio e entra alguém e decide por mim, sorrio para mim mesma e sigo a minha vida, afinal de contas ia já sair na próxima paragem. Estando neste trabalho, com estas funções, este horário, este ordenado, sem saber o que decidir, quero acreditar que abro um espaço para que a vida decida por mim. Com sorte, essa decisão faz-me sorrir para mim mesma e seguir em frente, para melhor.
 
 
 
PS: a escrita é uma ferramenta mágica: antes de publicar encontrei este post de há 4 meses e quero acreditar que o meu eu passado, de alguma forma sobrenatural, estava a escrever para mim, agora.